Linda Veneza


Deve haver um outro mundo por detrás de cada amante.

Os passos causavam tal som insignificante ao entrar em contato com os pedregulhos infinitos que revestiam a calçada por onde nossos pés pisavam sem dó, correndo contra o tempo para que nossas vidas se tornassem meramente significantes ao longo da história não contada e do amor recíproco que havia entre nós, seres indefesos que jamais souberam entender da onde vinha tanto encanto.
Dos seus olhos castanhos e profundos, dos cabelos rasos que jamais me permitiram que eu me prendesse meus dedos possessivos entre os fios curtos demais e escorregadios por causa do suor explicado nos mil e um pedidos calados por beijos necessitados.

Dos seus medos que me fazem querer protegê-lo, dos seus sorrisos mais sinceros…

Em meio as ondas não existentes das águas claras desse rio em Veneza, eu te amei e disse pela primeira vez. Sem remorso do nosso futuro traçado e da tristeza que os beijos passavam pelas línguas que por muito se seguraram para dizer aquilo que mais temiam admitir aos céus, trazendo-nos até ali. Naquele barco prestes a afundar nas desonras que  cometeriamos ao sair dali fingindo não se conhecer.

Eu te amo. Sempre te amei… Sabes muito bem disso, não é?

O desejo interrompido trouxe a tona não só a saudade guardada a tempos mas também a dor de não acordar ao lado um do outro toda manhã de primavera meio termo, sem pijama, jogado em meus braços ainda cansados de torná-lo meu todas as noites da minha vida sã, não escondendo nada além de seus nudes mais marginais que exitavam-me de forma incongruente.
Esquecendo os medos por um segundo, eu pude sentir muito mais que sua não-pureza tomando conta de mim assim como minha boca gritava seu nome em meio aos arranhões não cicatrizados e eu via, entre olhos meio fechados, sua boca pedir por mais assim como eu disse ao te beijar pela primeira vez naquele beco perto de seu apartamento que eu já conhecia tão bem quando suas fraquezas e assim sabia, que ao tocar sua pele em baixo da camisa branca, eu o faria se arrepiar sem que uma brisa o faze-se sentir frio na noite em que você retribuiu não só meus lábios, mas meu coração quebrado.

Talvez você não saiba ou apenas finja não entender, eu te quero a quatro paredes e a quatro continentes… Quero casar-te comigo.

As lágrimas se juntavam ao suor que nossos corpos colados criavam junto aos gemidos abafados por travesseiros e beijos de uma despedida já programada.
Não deveria escapar de minhas mãos tão cedo, mesmo sabendo que logo amanheceria, você relutava em largar a poesia de nosso conjunto não junto.

Meu amor…

Mais uma vez eu te vi sair por aquela porta vermelha, deixando-me largado na cama não arrumada e nas lembranças recentes que perturbavam minha mente, criando uma saudade nova, um desejo incontrolável e um medo, pela vigessima vez, quase não existente mas suficiente para prender-me naquele travesseiro agora tinha seu cheiro impregnado entre minhas lutas internas.

Foda-se.

Corri tanto a procura de tua alma entre as ruas abandonadas pelas pessoas vivas que agora perdiam tempo dormindo em suas camas organizadas e seus sonhos não realizados. Seus cabelos continuavam os mesmos, reconhecendo-lhes tão rapidamente quando a corrida que deu até seus braços relaxados e sua mente perdida em diferentes mundos, menos no nosso.
Sentir seus lábios novamente, tirando a dor de tudo fez-me apertar as pálpebras na tentativa de não imaginar o pior que poderia acontecer ali, naquela rua quase deserta de amor que muitas vezes me fez te deixar ir, sem rumo pelas calçadas de concreto triste.

Os continentes que esperem, pois eu a pouco, descobri que você era meu.

Em 1980, minha alma se encaixou na sua e assim, eu me vi perdido na profundidade de seu amor dito e repetido por atos de carinho e obscenidade, entre as mil pessoas que logo viram, suas mãos presas as minhas naquele barco a remo sem rumo entre os rios daquela cidade onde o amor fez-me ver seus olhos no meio ao show barulhento.

Eu te amo.

E assim foi, sem mais nem menos, te encantei das piores formas possíveis, fazendo-te de alguma maneira não explicável, amar-me e pedir-me em casamento em pleno verão ensolarado dos seus dias mais cansativos.

Sim.

Mas eu não aceitei assim.



Tentativa de texto | Viclst

Comentários

Postagens mais visitadas