Suéter


Escrito por Vic Stefenon


Tudo estava perfeito naquele dia que nos encontramos no parque. Você com uma camisa listrada e eu com seu suéter que você disse ficar melhor em mim do que em você. Ainda tinha seu cheiro quando eu te abracei e mais uma vez pude senti-lo antes de te dar um dos meus melhores sorrisos.

Sentamos em uma toalha vermelha quadriculada e começamos a conversar. Como sempre.
Você a me falar da sua vida e das coisas que te interessavam com um dos mais incríveis olhares que tu já direcionou a mim e eu a escutar pacientemente enquanto em minha mente a única coisa que se passava era os seus lábios. Deviam ser tão macios quanto eu achava, tão saborosos quanto o café que você me disse que tomou antes de vir apressado do seu trabalho no centro da cidade.

Tudo estava perfeito naquele dia que nos encontramos no parque.
As pessoas dançando no ritmo de suas vidas alheias enquanto nós riamos e contávamos mais uma vez aquela mesma história na tentativa certeira de relembrar um momento já antigo para nós que crescemos ouvindo as mesmas coisas.
Você estava com as mãos presas na frente dos joelhos e eu o notava a ansiedade na sua voz toda vez que você falava de amor e coisas que você considerava tão bobas quanto isso. Notava seu olhar divertido toda vez que via uma nuvem com forma de algo no céu enquanto eu apenas olhava para uma única forma a minha frente. Tão bela e colorida com suas listras e sorrisos tortos para todos que, sem querer, esbarravam em nós.

Me lembro perfeitamente da moça a vender algodão-doce na rua e do homem a correr atrás de seu filho enquanto o garotinho ria da brincadeira de deixar o pai mais uma vez naquele dia. Lembro da canção que o carro que passou ouvia, do sorriso da garotinha ao ganhar um balão. Eu lembro de tudo isso, mas não lembro de nenhum momento falando algo, de fato, para mim.

Tudo estava perfeito naquele dia que nos encontramos no parque. O parque que ela gostava, você usando a camisa que ela gostava enquanto falava da sua vida e quanto ela era interessante. Que parecia um anjo e que nada mais importava em sua vida se pudesse se casar com ela e criar um filho tão brincalhão quanto aquele que passou por nós, uma filha tão feliz quanto a menina que ganhou o balão.
E mesmo assim eu estava ali, ouvindo e rindo de um modo tão falso quanto a flor que a dois anos está guardada em meu armário, sem morrer e sem fazer nada de sua vida objetificada e completamente estragada pela minha má mania de deixar uma coisa escondida pela simples preguiça de colocá-la em algum lugar melhor ou jogá-la fora.

Me lembro perfeitamente que você me disse que ela ama algodão-doce, que queria ser um pai incrível para os filhos que um dia quer ter com ela. Lembro que a canção que o carro que passava ouvia te fez lembrar ela. Lembro da minha incapacidade de odiá-la pelo simples fato que ela te fazia sorrir como eu jamais vi; fazia seu olhar brilhar como nenhuma outra luz conseguiria.

Tudo estava perfeito naquele dia que nos encontramos no parque. Você com uma camisa listrada e eu com seu suéter.
É apenas poliéster, você disse quando eu citei o quão romântico parecia ser.

Tudo estava perfeito, apenas meu coração que pouco a pouco desejou fugir assim como o garotinho, se estourou igual ao balão da menina e foi devorado, masticado e em algum momento se perdido junto ao algodão-doce da mulher que uma hora se tornou de outra pessoa que eu sequer sabia quem era.
E não estava preparada saber quando você me disse que a amava.
Como nunca amou antes.

 . . .Conto inspirado na música "Heather" escrita por Conan Gray.





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